quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

TIO OSÓRIO

TIO OSÓRIO Paulo Toledo Que não tem uma mão é maneta, não tem perna é perneta, não tem olho é zarolho ou caolho e por aí vai... Agora, quem não tem uma orelha eu não sei como se chama. E, o tio Osório do meu pai, ele dizia que não tinha uma orelha. Se a esquerda ou direita, isso ele não se lembrava mais. Eu não conheci esse tal tio do meu pai. Mas ficou para mim a imagem de uma pessoa, que apesar de normal, como todo mundo, não dava sorte com as que hoje chamamos política corretamente, de afro-descendentes. De certa feita. Levou uma tremenda surra de um desses, só porque o chamou de “negro fedido”. Meu pai aproveitava essa lição do seu “desorelhado” tio para me ensinar: __Meu filho, aprenda isto: a verdade dói muito. O meu tio Osório foi chamado de tudo que é nome, até de filho-da-puta, por um preto, coisa que ele não era. No entanto, a única verdade que ele disse: “negro fedido”, para uma pessoa que era catinga pura, quase acabou com a sua raça. Em certa ocasião, para provocar meu pai, por causa dessa falta de orelha do tio dele, eu o transformei na personagem daquela velha piada do circo do Congonhal. O circo tinha anunciado um espetáculo fantástico: “O Homem Que Come Homem”. Estava literalmente lotado quando veio alguém no centro do picadeiro e anunciou: __Atenção distinto público! Não vai haver mais a nossa principal atração! Vai ser impossível! O Homem que come está aqui presente, mas o homem que ia ser comido não veio. Tio Osório, que na ocasião tinha as duas orelhas, protestou: __Eu paguei e quero ver. Não aceito desculpa. Daí lhe disseram: Vai lá e substitui o fujão. Tio Osório pulou no picadeiro e um baita negão, o comedor de homem, o agarrou e gritou para a platéia: __Eu começo a comer pela orelha. Toma aqui esta dentada. Meu pai não gostou da brincadeira: __Mas que falta de respeito.

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